RTA ou Mehlich-1?

RTA ou Mehlich-1?

A análise de fósforo lábil (P-lábil) em solos, fósforo prontamente disponível para as plantas, pode ser realizada através de diversos métodos de extração. 

No Brasil, os laboratórios comerciais têm realizado a extração de P-lábil pelos métodos da Resina de Troca Aniônica (RTA) e Mehlich-1. Outros métodos também possuem vantagens e limitações para extrair o P-lábil, como: Olsen, Bray-1 e Mehlich-3.

A escolha do método mais barato e menos trabalhoso para extrair o fósforo disponível talvez não seja o caminho mais adequado a seguir. A eficiência da extração, que está associada a diversas propriedades do solo, muitas vezes é negligenciada, quando na verdade, deve ser o critério principal a ser observado na hora de realizar a análise de P-lábil.

Evidentemente que durante a escolha do melhor método de análise, além da eficiência de retornar a quantidade de fósforo passível de ser absorvido pelas plantas, o método possibilite menor geração de resíduos no laboratório, seja de execução prática e de custo reduzido. Muitas vezes é difícil encontrar todas essas características no mesmo método. É como querer encontrar o bom, barato e rápido no mesmo produto ou serviço. Nesse sentido, os métodos analíticos necessitam estar em constante processo de aperfeiçoamento, mas sempre em busca daquele que melhor se correlacione com o conteúdo de fósforo na planta.

O Mehlich-1 é um extrator ácido. A dissolução parcial por íons de hidrogênio dos colóides inorgânicos do solo possibilita a extração do P ligado ao Ca, Al e Fe. Ele é um extrator sensível às variações das propriedades do solo, extraindo frações não lábeis, como as formas de P ligadas ao Ca e sofrendo desgaste em solos argilosos (altamente intemperizados).

Já o método da RTA extrai o P por troca iônica, simulando o comportamento do sistema radicular das plantas na absorção de fósforo do solo, caracterizado pela transferência do P lábil para a solução do solo e daí para as raízes. Com isso, minimiza os problemas apresentados pelos extratores ácidos, extraindo parte ou todo o fósforo lábil sem afetar significativamente as principais propriedades do solo.

 

Os solos cultivados da região do Vale do Submédio São Francisco têm apresentado valores elevados de pH e altos teores de "P-lábil" extraídos por Mehlich-1. Em algumas situações, altos teores de Cálcio trocável.

Observando as diferentes características dos métodos de extração de P-lábil e dos solos da região do Vale do São Francisco, a PlantSoil Laboratórios, através da supervisão de um trabalho de conclusão de curso (TCC) de uma aluna de Engenharia Agronômica da Universidade Federal do Vale do São Francisco, desenvolveu um experimento preliminar e pioneiro para os solos da região no intuito de observar a capacidade de extração de P-lábil em dois solos com diferentes texturas.

O experimento foi desenvolvido em casa de vegetação, em delineamento em blocos ao acaso com quatro repetições. Os tratamentos consistiram de dois fatores: Solo (textura média e textura arenosa) e doses de P2O5 (0, 60, 120, 240, 360 e 480 mg/dm3). O fosfato de amônio foi a fonte de P utilizada. Para correlacionar o P disponível no solo com o P absorvido pela planta foi utilizada a Brachiaria brizantha cv. Piatã como planta-teste. Foi realizado o equilíbrio nutricional quanto aos demais macro e micronutrientes necessários para o desenvolvimento da planta-teste.

A hipótese de que os dois métodos de predição de P-lábil são significativamente diferentes tanto para o solo arenoso quanto para o de textura média foi confirmada através do teste de Leite & Oliveira (2002) (Figura 1).

Figura 1. Comparação dos métodos Resina trocadora aniônica (Yj) vs Mehlich 1 (Y1) para extração de P disponível nos solos de textura arenosa (A) e média (B), segundo as regras de decisão do teste L&O a nível de significância de 0,01.

Como pode ser observado na figura 2, há uma tendência do extrator Mehlich-1 apresentar maiores teores de P-lábil em relação à RTA. Com o incremento das doses de P2O5, a distância entre os teores de P-Resina versus P-Mehlich-1 é cada vez maior. Esse comportamento pode, eventualmente, ser indicativo de que o Mehlich-1 está extraindo frações não lábeis de P, principalmente aquelas frações de P ligadas ao Cálcio em condições de pH mais elevado (característica dos solos utilizados neste trabalho).

Figura 2. Teores de P-lábil (Resina de Troca Aniônica e Mehlich-1) em função das doses de P2O5 aplicadas.

Por outro lado, os dois métodos de extração apresentaram boa correlação com a Produção Relativa da Brachiaria brizantha cv. Piatã (Figura 3). Isso mostra que para as condições controladas de estudo, os dois métodos mostraram-se eficientes em predizer os teores de P-lábil, no entanto, em proporções completamente distintas. Por exemplo, para obter 90% da produtividade máxima agronômica (PMA) os teores de P no solo foram de aproximadamente 110 e 169 mg/dm3 para os extratores RTA e Mehlich-1, respectivamente. Já para obter 70% da PMA os teores de P no solo foram de aproximadamente 53 e 78 mg/dm3 para os extratores RTA e Mehlich-1, respectivamente.

Figura 3. Produção Relativa da Brachiaria brizantha cv. Piatã em função dos teores de P extraídos pelos métodos da Resina de Troca Aniônica e Mehlich-1 nos solos analisados.

Nesse sentido, na hipótese de utilizarmos as tabelas de interpretação dos teores de P disponíveis, como exemplo Raij et al. (1996), que para plantas perenes classifica o teor de P-Resina acima de 60 mg/dm3 como "muito alto", estaríamos induzidos a não gastar com fertilizantes tendo em vista que essa classificação indica que não haverá ganhos em produtividade que reflita em retorno econômico. Mas como apontado anteriormente, este nível de P-Resina (60 mg/dm3) estaria próximo de 70% da PMA e longe de 90% da PMA da Brachiaria brizantha cv. Piatã.

Já para o extrator Mehlich-1, a situação chega a ser um pouco mais crítica quanto às tabelas de interpretação de P-lábil. De acordo com Cantarutti (2007), para classe textural média, os teores de P acima de 15 mg/dm3 são considerados adequados, ou seja, longe dos 78 e 169 mg/dm3 de P-Mehlich-1 necessários para obter 70 e 90% da PMA da Brachiaria brizantha cv. Piatã, respectivamente.

O experimento em condições controladas aqui descrito nos permite afirmar que há necessidade real de estudados mais aprofundados com diferentes tipos de solo (quanto à textura, mineralogia, teores de matéria orgânica, entre outras propriedades) e em condições de campo para que possamos indicar o melhor extrator de P-lábil para os solos da região do Vale do Submédio São Francisco.

Para aqueles que buscam maior eficiência no sistema de produção, podem ser conduzidos trabalhos de correlação e calibração que indiquem os níveis críticos adequados de P para a situação específica de solos e cultura da propriedade, buscando aperfeiçoar as aplicações de fertilizantes fosfatados para obter incrementos em produtividade e aumentar a eficiência por unidade de P2O5 aplicado.

Texto: Jailson Cunha, Eng. Agrônomo, Dr. em Solos e Nutrição de Plantas, Gestor da PlantSoil Laboratórios - This email address is being protected from spambots. You need JavaScript enabled to view it.

Créditos do trabalho de TCC: Juliana Izidro, Engenheira Agrônoma - This email address is being protected from spambots. You need JavaScript enabled to view it.

 

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